sábado, 29 de agosto de 2009

Fim de uma história musical


Infelizmente nem tudo acaba do jeito que gostaríamos que terminasse. Coisas da vida, diriam os mais doutos na arte de se equilibrar entre as idas e vindas, entre os altos e baixos dos acontecidos. Nem só de anunciar boas novas vivem as notícias, por falar em vida. Nem todas elas são alegres. Há as de morte, as de fim, enfim.
Nessa última categoria a que passo a desenvolver.
Quem me conhece já deve ter ouvido eu contar entusiasmado a minha primeira "balada" em São Paulo, em junho de 97, após uma frustrada festa junina no colégio "Santa Marcelina". Brevemente relatarei para ilustrar a importância do Villagio Café em minha história aqui em Sampa.
Pois bem. Noite de São João de 1997.
Nos primeiros seis meses desde que cheguei de Tatuí (Capital da Música, Cidade Ternura!) morei em uma pensão para estudantes na Rua Itamarati, proximidades do estádio do Pacaembu. A estratégia era ter tempo para ver com calma apartamento e colega para rachar o aluguel. Luciano, o "Goiano", foi quem dividiu comigo (e mais tarde com meu irmão mais novo) o tal apartamento. Antes disso Goiano já tinha se tornado amigo de bagunça. Foi dessa forma que aceitei o convite para ir à festa junina do Colégio Santa Marcelina. Eu recém ingressado na faculdade, não estava longe em termos de idade daquelas menininhas bonitinhas que víamos diariamente saindo do 3º colegial. O que não pensamos foi que por se tratar de uma festa de colégio, e de freiras, as tais menininhas, evidentemente, não se misturariam além das panelinhas de amigos. Pior: não contávamos que antes mesmo das 23 horas, tocando um grande sino de mão, uma das freiras viesse acabar a festa ("-Acabou, gente!", dizia ela), seguindo-se um suceder de luzes apagadas, som desligado, últimos quentões servidos.
Voltamos frustrados - e putos - para a pensão. Aí entra o terceiro personagem dessa história. Paulão, o psicólogo-filósofo-boêmio de Alagoas.
Paulo era psicólogo em Maceió e estava em São Paulo para concluir o Mestrado em fenomenologia na PUC. Gente boníssima, sempre nos propagandeava as boas noites de chorinho no Bixiga. Após sua garrafa semanal de vodka, lá ía o sujeito para suas andanças aos finais de semana no famoso bairro paulistano.
" - Que merda de boêmios vocês são para chegarem em casa antes das 23 horas? 'Vamo' embora comigo. Vou levar vocês para conhecer o Bixiga!"
Sexta-feira. Nas bancas, a Folha de São Paulo havia lançado naquele dia seu Guia da Folha. Já no táxi, com seu Guia da Folha nº 1 que trazia na capa reportagem sobre o Terraço Itália, Paulão, sem se importar com sua camiseta furada no suvaco, nos pediu permissão para, antes de irmos à esbórnia, nos levar para o tal alardeado restaurante com sua "bela vista da metrópole". Fomos apenas ao bar do Terraço Itália, mas que foi suficiente para nos deleitarmos com a vista (sim, era mesmo maravilhosa) e os fogos pululando aqui e ali na cidade. Era noite de São João, como já dito. A cereja do bolo: o garçom, Seu Raimundo, também era alagoano de Maceió. Rapidamente criou-se um vínculo de cumplicidade entre nosso anfitrião e o bom atendente. Na hora da conta, o chorinho de stenheger foi maior que as próprias doses. Por falar em chorinho, foi trançando as pernas que nos levantamos para enfim ouvir um, no tal Bixiga.
Noite que Paulão fez questão de nos levar a todos os bares da 13 de Maio, sem pagar entrada , já que " - Trouxe os meninos para conhecer a casa, só entar, tomar uma cerveja e sair", não sem antes ligar para Maceió para prestar contas a patroa - eram já três e meia da manhã quando fez a ligação - e passar o telefone para que a mulher "conhecesse os meninos", a esta altura já bem embriagados.
Se a noitada marcante de iniciação noturna em Sampa terminou com o rock - e com mais cerveja - do Café Piu Piu, ela começou com o fantástico ambiente de chorinho do Villagio Café.
O lugar era fabuloso. Pequeno mas aconchegante, o som maravilhoso. Inúmeras outras vezes voltei ao lugar, inclusive levando amigos e pessoas de fora quando vinham para São Paulo.
Pelo palco do pequeno bar da Praça Dom Orione passaram vários nomes já consagrados ou que viriam a se consagrar depois no cenário musical.
A casa sempre primou, desde sua fundação em 1992, pela qualidade da programação, isso é fato. Mas a mudança de endereço, deixando para trás a charmosa localização de outrora e se instalando na barulhenta e comercial esquina Teodoro Sampaio/Henrique Schauman talvez tenha sido o início do fim que agora se anuncia. O Villaggio Café noticiou o encerramento de suas atividades.
Se você leu este texto até aqui talvez tenha se interessado pelo lugar. E se a notícia não é alegre, cumpre então festejar ao menos a história do lugar, de quase 18 anos. Se antes mesmo de completar a maioridade já deixa órfãos vários apreciadores da boa música, que seja feita ao menos uma boa festa de despedida. E é exatamente isso que os sócios da casa resolveram fazer.
Este sábado, dia 29, será a última noite de funcionamento da casa. Provalvemente casa lotada de amigos e músicos. Músicos que irão se revezar, a partir das 21 horas, no palco aberto para quem quiser tocar, sem roteiro determinado, homenageando o Villaggio Café.
Não haverá cobrança de couvert e a alegria promete tomar conta do lugar, ainda que com a emoção natural de uma despedida, de um fim anunciado. Mas sem que uma freira venha tocar um sino de mão. Que novas luzes se acendam em outros cantos.

Um comentário:

1/2 Dúzia de 3 ou 4 disse...

O Villaggio foi/é o mais importante boteco da cena musical paulistana, cuíca do mundo. Hoje iremos lá cantar nossa última homengaem.